Project Car: Saveiro GTi, a picape que a Volkswagen deveria ter feito

Texto e fotos | Júlio Max, de Teresina - PI
Matéria feita em parceria com @showcarsthe

No final dos anos 1980 e ao longo dos anos 1990, o Gol GTi foi uma das principais estrelas da Volkswagen no Brasil. A versão esportiva do hatch tinha tratamento diferenciado do restante da linha de modelos compactos da marca (que incluía Voyage, Parati e Saveiro), sendo o único da gama a ter o motor AP-2000 com injeção eletrônica - e que começou a estar disponível no nosso País em 1989. É bem verdade que, ao longo dos anos, a VW também criou variações diferenciadas para o sedã, a perua e a picape. A Saveiro, por exemplo, teve séries especiais memoráveis como a Sunset (1993) e a Summer (1995), que hoje já atingiram o status de colecionáveis e são bastante valorizadas quando originais e bem conservadas. Mas as versões mais potentes da primeira geração da Saveiro tiveram, no máximo, o motor 1.8 AP, e nunca existiu uma versão GTi da picape de produção em série. 

Contudo, a criatividade do povo brasileiro não tem limites, e aqui estamos diante da Saveiro GTi - a versão que a Volkswagen nunca fez, mas deveria ter considerado fabricar. Antes da repaginação completa, este exemplar, originalmente uma CL 1.8 1994/95, tinha a carroceria na cor verde-escuro. Algumas poucas oficinas do Brasil, como a By Deni Studio, são especializadas na execução de transformações da Saveiro para a versão GTi. Já a unidade da nossa matéria ganhou vida nas dependências da oficina teresinense Santa Rita Auto Serviços. O processo completo de transformação deste exemplar consumiu aproximadamente um ano e meio.

A picape foi pintada na cor Vermelho Sport (um dos tons originais para o Gol GTi entre 1993 e 1994) e recebeu rodas BRW, com 17 polegadas, que possuem estilo semelhante às BBS (presentes no hatch esportivo entre o fim de 1991 e 1994) e são calçadas por pneus Farroad FRD 26 205/40. Houve inclusive o cuidado de pintar as molduras das janelas de preto e de inserir a antena de teto, exatamente como no GTi de fábrica (originalmente, a antena da Saveiro CL ficava alojada no para-lama dianteiro esquerdo). O emblema com a sigla da versão foi estampado nas colunas laterais, também pintadas de preto.

Os para-choques envolventes e prateados, com filetes vermelhos, também seguem o padrão do modelo esportivo, assim como as laterais inferiores da carroceria. Na frente, a picape recebeu um jogo de faróis de longo alcance da Rossi, em complemento às luzes de neblina embutidas na parte inferior frontal.

Na traseira, os destaques são as lanternas com lentes fumê, a tampa com os emblemas "2000", "GTi" e "Catalisador", além da capota marítima protegendo a caçamba.

O interior também foi totalmente refeito, seguindo os padrões do Gol GTi. A picape recebeu painel espumado com comandos-satélite (de fábrica, somente a Summer teve este tipo de painel, e apenas a partir de 1996), volante "quatro bolas" de quatro raios, quadro de instrumentos com iluminação vermelha, conta-giros, velocímetro até 240 km/h, luzes-espia, logo GTi e relógio digital, filetes vermelhos nos forrros de porta (com a parte superior espumada, áreas em tecido e revestimento inferior em veludo) e bancos Recaro Sport em tecido tear Laguna com faixas vermelhas e apoios de cabeça vazados. Já o forro de teto e o carpete do assoalho são pretos, e o fundo do porta-luvas possui carpete.

Outros detalhes internos desta Saveiro GTi são a alavanca de câmbio com perfurações ao estilo "bola de golfe", o aparelho de som Pioneer Mosfet 50W X4 com entradas USB-A/auxiliar e MP3/WMA Player, o mostrador da injeção eletrônica programável Fueltech FT300 instalado no local do cinzeiro (o aparelho registra, entre outras coisas, tensão da bateria, temperatura e rotação do motor, TPS, pressão da turbina, ponto de ignição e abertura de bicos injetores) e os instrumentos adicionais instalados na parte inferior do painel, que exibem, da esquerda para a direita, a pressão do óleo do motor, a pressão do turbocompressor e a pressão do combustível. 

A Saveiro GTi desta matéria teve seu motor turbinado e convertido para rodar com etanol, além de contar com peças forjadas (como pistões e bielas). Seu turbocompressor atua com 0,5 kg de pressão e foi instalada uma embreagem cujo platô exerce pressão de 1200 lbs. A cilindrada aumentou de 1.8 para 1.9, e, com alguns acertos, seu rendimento pode chegar em torno de 300 cavalos.

Inicialmente rústicas e estritamente voltadas para o trabalho, as picapes foram conquistando cada vez mais espaço dentro das cidades a partir da segunda metade dos anos 1980 no Brasil. Entre os motivos que fizeram a popularidade das utilitárias de caçamba aumentar, estiveram fatos como a ausência do valor pago a título de empréstimo compulsório (vigente no País entre julho de 1986 e junho de 1987), o surgimento da categoria de picapes derivadas de automóveis de passeio e a possibilidade de inclusão de itens de conforto, como direção hidráulica e vidros elétricos. A partir desta época, ser picapeiro já não tinha relação com a necessidade de carregar cargas na caçamba, e passava a ser um estilo de vida.

Lançada no Brasil em 1982 e hoje quarentona, a Saveiro foi a quarta (e última) integrante da família Gol a ser apresentada ao mercado. Sua frente era similar à do hatch, com faróis quadrados e piscas instalados no para-choque (Voyage e Parati tinham lentes retangulares, com piscas mais integrados). A picape chegou ao mercado somente com o motor 1.6 com refrigeração a ar, a gasolina ou álcool - a opção do AP-600, refrigerado a água, só apareceu três anos depois. Em 1987, a picape acompanhou a reestilização promovida a toda a família Gol, mas seus para-choques não eram tão envolventes como no restante dos modelos, deixando a lataria exposta na parte inferior. No ano seguinte, viriam o interior redesenhado e os retrovisores mais integrados à carroceria. Curiosidade: a Volkswagen tratou sua picape no gênero masculino ("o Saveiro") ao longo da década de 80, mas depois rendeu-se à tendência nacional de se referir a estas utilitárias no feminino.

Para a linha 1991, ocorreu a segunda reestilização sobre a carroceria "quadrada". Logo em seguida veio o para-choque dianteiro mais envolvente. No ano de 1997, finalmente a picape passou a dispor de injeção eletrônica de combustível. A Saveiro também foi a última representante da linha Gol a evoluir para a geração "bolinha", em novembro de 1997 (cerca de três anos após o hatch). 

Impressões ao dirigir

Ao entrar na Saveiro GTi, uma das coisas que nos transporta diretamente para os anos 1990 é a presença de várias chaves - mais especificamente quatro: uma para a ignição, outra para a fechadura da tampa do tanque de combustível e mais duas (em outro chaveiro) para as portas. Fora isso, as maçanetas externas são fixas, com pequenos gatilhos separados. O volante tem uma textura firme e lisa, com ranhuras para os dedos. Outro aspecto que nos leva para o passado é a presença dos quebra-ventos à frente das janelas, úteis para refrescar os ocupantes dianteiros em uma época em que ar-condicionado ainda era privilégio de carros mais caros. Os vidros são elétricos e a janela traseira se abre em duas partes corrediças e contrapostas. Estas alternativas de arejar a cabine são providenciais, já que a área do túnel esquenta ao rodar (algo comum entre os Volkswagen quadrados preparados).

Pé na embreagem e mão girando a chave na ignição. O ronco desta Saveiro é música para os ouvidos de quem gosta de carro. Mesmo sem acelerar tanto, é possível ouvir os "suspiros" do turbocompressor entre as passagens de marcha. O cheiro de álcool exalado na parte traseira e o nível de vibrações do motor AP também fazem parte da atmosfera desta picape. Os engates de câmbio e a estabilidade da carroceria também agradam. Dirige-se em posição baixa - perto desta Saveiro, até mesmo um up! parece uma minivan.

Um aspecto bem surpreendente são os freios: normalmente deixados para um segundo plano quando a intenção é fazer uma preparação do conjunto mecânico, esta Saveiro foge à regra e freia praticamente como um carro dos dias de hoje. Apesar de ser rebaixada e utilizar rodas de 17 polegadas, a picape consegue passar pelas irregularidades do piso com mais conforto do que o visto em outros carros semelhantes (que quicam e raspam com facilidade).

Esta Saveiro GTi saiu às ruas depois de pronta pela primeira vez em junho deste ano. Pouco depois, em setembro, ela mudou de dono, passando a ser o novo Project Car do Show Cars Elite, no lugar do Volkswagen Golf "Smoke" (relembre dele neste post). O hatch foi vendido a um entusiasta do Pará, que enviou seu preparador para viajar com o carro de Teresina (PI) até o Estado da região Norte. No mesmo dia, horas depois da entrega do "Smoke", chegava a hora de dirigir pela primeira vez a picape esportiva.

Veja a Galeria de Fotos da Volkswagen Saveiro GTi!
















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